Conselho Nacional de Saúde acredita na regulamentação das plataformas na internet como medida para barrar movimento antivacina e desinformação na saúde
O Brasil tem vivenciado momentos desafiadores na luta pela votação do Projeto de Lei 2630, conhecido popularmente como PL das Fake News. O projeto reitera a regulamentação e fiscalização sobre os conteúdos veiculados nas redes sociais e aplicativos de mensagens, além de tratar sobre a responsabilização de quem produz desinformação, discurso de ódio e incentivo às violências físicas e psicológicas, que podem causar diversos adoecimentos à população.
O Conselho Nacional de Saúde (CNS) defende a aprovação do projeto pelo fortalecimento da democracia e valorização da saúde física e mental da população brasileira, buscando combater os discursos de ódio e a desinformação. Retirado da pauta de votação da Câmara dos Deputados, nesta terça (02/05), o PL segue sem data para apreciação.
O texto vem sendo alvo de críticas e, ironicamente, de desinformação, por apresentar aspectos polêmicos e controversos, entre eles a definição do órgão fiscalizador responsável por aplicar punição às empresas que descumpram a lei e a remuneração dos autores de conteúdos jornalísticos e artísticos compartilhados nas plataformas das grandes empresas de tecnologias, conhecidas como big techs.
Desinformação e saúde pública
A desinformação permanente e a falta de ações efetivas para combate-la afetam as políticas públicas à saúde mental da população. É o que mostra o relatório do Laboratório de Estudos de Internet e Mídias Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (NetLab/UFRJ). Segundo os pesquisadores, houve um pico de conteúdo antivacina nas plataformas digitais no dia em que o Movimento Nacional pela Vacinação foi lançado. Somente no Twitter, foram catalogadas mais de 50 mil publicações, 20 mil publicações no Facebook e 6 mil no Instagram com conteúdos falsos sobre a vacina.
Todo esse movimento negacionista e contra a ciência foi apontado pela ministra da Saúde, Nísia Trindade, como um ato criminoso. “Temos enfrentado uma forte campanha, desde fevereiro de 2023, de fake news [notícias falsas] envolvendo a vacina bivalente. Isso é extremamente sério, e eu tenho destacado que não se trata de desinformação, se trata de ação criminosa”, destacou Nísia.
Segundo o presidente do CNS, Fernando Pigatto, a aprovação do PL 2630 significa o fortalecimento da democracia brasileira e defesa da vida. Ele destaca que a discussão estará presente na 17ª Conferência Nacional de Saúde. “As mentiras disseminadas durante o auge da pandemia da Covid-19 no Brasil, que tanto tiraram vidas, geraram o ódio à ciência, ao SUS e às medidas de combate à doença cientificamente comprovadas”, disse Pigatto.
Segundo Cris Cirino, pesquisadora em desinformação nas redes sociais digitais e integrante do Grupo de Pesquisa Inovação e Convergência da Comunicação- InovaCom/UFPA, o PL 2630 é o pontapé para a regulamentação das plataformas no nosso país, evitando que as grandes empresas de tecnologia estejam isentas de responsabilidade sobre o que é veiculado em seus ambientes digitais. “Um exemplo desse cenário lamentável é a baixa nas coberturas vacinais no país. Por causa da livre circulação de informações falsas, doenças que já haviam sido erradicadas no Brasil voltam a aparecer, como é o caso da Poliomielite, Sarampo e Varíola”.
Guerra de narrativas: Prós e Contras
Representantes de mais de 100 organizações da sociedade civil e entidades acadêmicas que integram a Sala de Articulação contra a Desinformação (SAD) dividem opiniões sobre alguns pontos do texto. A imunidade parlamentar sobre as manifestações dos congressistas no ambiente digital é um deles.
Em entrevista à Agência Brasil, Ramênia Vieira, coordenadora executiva do Intervozes Coletivo Brasil de Comunicação Social, afirma que a garantia de imunidade parlamentar cria uma categoria de usuários acima do restante da população. “Parece uma autorização para que os parlamentares, que são grandes propagadores de desinformação, continuem usando suas redes para distribuir essa desinformação”, afirma.
A Coalização Direitos na Rede, que reúne mais de 50 entidades, não vê problemas no projeto, ainda que o texto apresente aspectos de melhorias. Em nota, a CDR enfatiza que “o Projeto de Lei é a oportunidade chave para avançar em direção a um ambiente digital que proteja os cidadãos e assegure direitos”.
A Coalizão destaca o seu posicionamento sobre a possibilidade de o órgão fiscalizador da regulamentação ser atribuído à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e reforça que “apesar deste recuo grave, o projeto segue trazendo regras importantes para limitar o poder das plataformas digitais e empoderar a sociedade e, portanto, deve prosperar”.
Contra
Bem distante do apoio ao PL 2630, estão as grandes empresas afetadas caso o projeto seja aprovado, como a Meta (dona do Facebook, Instagram e Whatsapp), a Google, como uma das grandes plataformas de busca e que possui o YouTube, e o Telegram que, recentemente, foi multado no Brasil por se recusar a apresentar dados de usuários de um grupo antissemita, referente a uma investigação em curso pela Polícia Federal sobre materiais neonazistas, tutorial de assassinatos, além de vídeos de mortes violentas.
As plataformas se defendem alegando que não há como controlar e nem se responsabilizar sobre os conteúdos postados por terceiros e anúncios monetizados. Afirmam ainda que o PL trará prejuízos aos negócios e afetará a liberdade de expressão do usuário.
Ascom CNS
Foto: Marcelo Pozzebom/Agência Brasil