Enquanto na região Sul, o problema teve uma redução de 16% até janeiro deste ano, na Norte, onde 98% das cidades apresentavam os piores índices de classificação antes da chegada do coronavírus, praticamente a totalidade delas permaneceu nessa situação.
O estudo é do Centro e Integração de Dados e Conhecimento para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), que construiu um índice para medir os efeitos das desigualdades sociais na saúde, e será lançado oficialmente nesta quarta-feira (30).
Segundo os pesquisadores, a disparidade vista no país já existia antes da Covid-19, mas foi intensificada nos últimos dois anos. No pré-pandemia, no Sudeste, apenas 35% dos municípios eram classificados com os piores índices e, no Sul, 7%. Acompanhando o Norte no problema, o Nordeste possuía 99% das cidades nessas categorias.
No caso da região Norte, os efeitos econômicos da doença se mostraram muito presentes. Segundo a pesquisadora em Ciências Farmacêuticas Terezinha de Jesus, integrante do Instituto de Mulheres Negras do Amapá e colaboradora da pesquisa, um exemplo desse cenário é a situação das mulheres ribeirinhas, da floresta ou da região rural, que tiveram suas atividades paralisadas.
“As pessoas foram para casa de parentes no interior e levaram o vírus para lá, inclusive, muitas pessoas muitas morreram” relembra Terezinha. A pesquisadora ainda destacou a grande circulação de desinformação, a espera por até uma semana para a chegada dos testes de Covid-19 analisados em Belém (PA) e a situação de fome.
Com isso, após a primeira onda da Covid-19, por exemplo, apenas 3% dos municípios do Norte haviam conseguido reduzir as desigualdades em saúde. No Sul, nesse mesmo período, esse índice chegava a 8%. No Nordeste, os dados se repetem. Em fevereiro de 2020, quase todos os municípios eram classificados nas piores classificações, sendo que em janeiro de 2022, eram 92%.
No Maranhão, por exemplo, Lúcia Gato, integrante do Grupo de Mulheres Negras Mãe Andresa, ouvida pela Fiocruz, destacou o forte impacto da pandemia nas mulheres negras. “A maioria das mulheres negras chefiam suas casas e cuidam dos seus filhos. Você ter uma situação em que você tinha mulheres chefes de família em situação de adoecimento, de cuidar sem ter esse cuidado, e com filhos em situação de risco”, relatou.
A epidemiologista Emanuelle Góes destacou a importância da inserção do racismo estrutural como categoria de análise da pesquisa, assim como percentual de pobreza, pardos e indígenas por conta das desigualdades que se relacionavam com as disparidades em saúde na Covid-19, além do percentual da população residentes em densidade domiciliar e percentual de idosos e situação de pobreza.
“A pandemia atingiu as pessoas negras de forma distinta por conta das desigualdades raciais. Era preciso que a gente desse evidência a isso”, afirma a pesquisadora.
O IDS-COVID 19 foi calculado com base em dados socioeconômicos, sociodemográficos e acesso aos serviços de saúde. Os pesquisadores utilizam a base do último Censo Demográfico do IBGE para acompanhar o número de leitos e respiradores e do Índice de Brasileiro de Privatização (IBP), que leva em consideração a renda, educação e condições de domicílio.
No Sudeste, a maior parte dos municípios ficou concentrada nos níveis intermediários do índice desenvolvido pela Fiocruz. Já no Sul, onde nenhuma cidade era classificada no pior agrupamento de desigualdade mesmo antes da pandemia, 196 de 1.188 analisadas conseguiram reduzir a disparidade dois anos depois.
A pesquisa da Fiocruz também contou com apoio de 40 pessoas entre representantes da área de gestão pública, representantes de entidades e associações de comunidades, pesquisadores e jornalistas. O projeto faz parte do Grand Challenges ICODA pilot initiative promovido pelo Health Data Reserch UK e financiado pela Fundação Bill & Melinda Gates e Fundação Minderoo.
Fonte: CNN