Esses óbitos foram atribuídos, por enquanto, à síndrome respiratória aguda grave 'inespecífica', de origem não identificada; este tipo tem sido mais comum onde há baixa prevalência de Covid-19
O número de óbitos no Brasil em decorrência ao novo coronavírus pode ser muito maior do que o computado pelas estatísticas oficiais. Além das 50.608 mortes divulgadas no domingo (21) pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e o Ministério da Saúde, ao menos outras 21.289 são suspeitas de terem sido causadas pelo Sars-Cov-2 desde o início do ano.
Os dados que permitem essa conclusão são do Sivep-Gripe, sistema utilizado pelo SUS para notificar e acompanhar os casos suspeitos que chegam aos hospitais e postos de saúde. Eles foram analisados pela empresa de consultoria Lagom Data.
Essas mortes foram atribuídas, ao menos por enquanto, à síndrome respiratória aguda grave (SRAG) “inespecífica”, de origem não identificada. De modo suspeito, o tipo inespecífico tem sido mais comum onde há baixa prevalência de Covid-19. É o caso do Mato Grosso do Sul, que tem a maior discrepância do Brasil, onde cada morte por Covid-19 é ligada a outras nove atribuídas à SRAG.
De janeiro a maio de 2020, o país registrou 16 vezes esse diagnóstico em comparação com a média dos sete anos anteriores. Já os casos de SRAG específica se mantêm na média.
Em março, pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz detectaram um disparo nas internações por SRAG, em paralelo aos casos conhecidos de coronavírus. Desde então, casos de SRAG são tratados como suspeitos para a doença e testados.
"Tecnicamente, essas ocorrências de SRAG poderiam ser por outros vírus, mas a desproporção é grande demais num ano em que a gente sabe que existe a Covid-19", comentou Eduardo Leite Costa, professor de pneumologia da Faculdade de Medicina da USP.
Testagem pendente
A definição dos critérios e do ritmo de testagem varia de estado para estado. Em Minas Gerais, por exemplo, o site independente Coronavirus-MG detectou que havia mortes de SRAG pendentes de teste para a Covid-19 acumuladas desde fevereiro.
No estado, que no início da pandemia se destacou com números bem menos impactantes dos que os do Rio e São Paulo, para cada dez mortes já atribuídas à Covid-19, há outras 45 classificadas como tendo sido causadas pela SRAG inespecífica.
Ainda segundo Costa, Minas é um exemplo de um estado que optou por investir mais por leito de UTI e menos em exames, de modo extremo. "Analisando o número de exames por habitante, é provável que ele seja indiretamente proporcional a essa disparidade entre SRAG e Covid-19", disse.
Sobre a aplicação do diagnóstico inespecífico, o professor ressalta que não é falha dos médicos. "É correto chamar esses casos de SRAG enquanto se espera um diagnóstico etiológico (que descreve a causa da doença). Assim você consegue monitorar esses números, porque o diagnóstico etiológico demora, sobretudo no Brasil", afirmou, acrescentando que também é preciso que em algum momento ocorra a confirmação do diagnóstico de Covid-19, "o que muitas vezes não acontece".
Fonte: Olhar Digital