Com 45% a menos de receita, o Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, cortou em 25% o salário e a jornada de trabalho de 33% dos seus 15 mil funcionários.
A decisão, que também atinge outros hospitais privados e filantrópicos do país, vale por três meses e está amparada pela medida provisória 936, que dispõe sobre o programa de manutenção de emprego e renda para enfrentamento da pandemia de Covid-19.
No Sírio-Libanês, com 8.300 funcionários, também houve redução de jornada de trabalho e de salários, remanejamento entre áreas e realocação de funções, segundo informou o hospital em nota, sem detalhar as medidas.
“Nosso hospital está engajado em superar esse desafio e a prestar a assistência necessária nesses momentos críticos.”
No Einstein, os cortes atingem ainda duas unidades de atenção primária e de medicina diagnóstica, que foram desativadas e realocadas em outros serviços da instituição.
Segundo Sidney Klajner, presidente da instituição, ao mesmo tempo em que houve queda dos procedimentos de alta complexidade (por exemplo, cirurgias eletivas) o hospital investiu muito para se preparar para uma alta demanda de Covid-19, que também não aconteceu no setor privado.
“Graças a esse investimento, foi possível transferir o excesso para o setor público. Hoje o Einstein está com um terço da capacidade de UTIs de São Paulo”, afirma o presidente.
Segundo ele, recursos extras de equipamentos, como respiradores, e de material de proteção individual foram repassados para um hospital referência da prefeitura em tratamento da Covid-19, o M’Boi Mirim, gerido pelo Einstein.
São 514 leitos, dos quais cerca de 130 de UTI —podendo chegar a 234. “A cada dia a gente abre 10, 20 leitos, conforme a demanda”, explica.
O Einstein também investiu em novos leitos no Hospital de Campo Limpo, no Vila Santa Catarina, no hospital de campanha do Pacaembu e em outro criado no próprio estacionamento do hospital, no Morumbi.
Klajner diz que, em razão da queda de receita e da diminuição da demanda em muitos setores, como nos consultórios, nos ambulatórios, na medicina diagnóstica e nos centros cirúrgicos, foi preciso reduzir a jornada e, consequentemente, os salários. O pessoal da enfermagem foi o mais afetado pela medida.
Um enfermeiro que prefere não ser identificado diz que todos os profissionais foram pegos de surpresa com o corte de salário. Ele ganha R$ 5.783 mensais.
“Ficamos sem opção. Ou concordávamos com a redução ou seríamos dispensados. Tenho despesas fixas, boletos, financiamento habitacional. Está muito complicado lidar com isso tudo. Com medo do contágio e agora medo das dificuldades que vêm pela frente. Jamais passou minha cabeça passar por isso.”
De acordo com Klajner, a parte do pessoal de enfermagem, de médicos, de fisioterapeutas, de nutricionistas, entre outros profissionais, que pôde ser deslocada para áreas hospitalares públicas sob gestão do Einstein o foi, sem redução de salário.
Segundo ele, o hospital já colocou em prática um plano de retomada dos atendimentos, com separação de setores Covid-19 e não-Covid-19. Antes da pandemia, o Einstein fazia até 140 cirurgias por dia. Agora, não chegou ainda à metade desse número.
Para Adelvânio Francisco Morato, presidente da FBH (Federação Brasileira de Hospitais), a situação dos hospitais privados está crítica em todo o país, com vários deles não só cortando salários mas demitindo funcionários.
“Os hospitais estão trabalhando com 20% a 30% da sua capacidade. Estão demitindo, antecipando férias,
diminuindo salários.”
A FBH, que reúne cerca de 4.000 pequenos e médios hospitais, ainda prepara um levantamento sobre essas perdas do segmento.
Morato afirma que, fora de São Paulo, especialmente em estados do Norte e do Nordeste, os cortes estão acontecendo em uma velocidade ainda maior. “Se não aparecer alguma ajuda, vão fechar, não há outra saída”, diz.
A ajuda esperada pelo setor pode vir por meio de uma linha de crédito especial do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento) voltada a pequenos e médios hospitais.
Yussif Ali Mere Júnior, presidente do Sindhosp (sindicato dos hospitais, clínicas e laboratórios do estado de São Paulo), diz que os hospitais do interior paulista também estão reduzindo salários de funcionários e tentando evitar ao máximo as demissões.
“Precisamos voltar minimamente ao normal, retomar os atendimentos nas cidades onde a pandemia está sob controle. Campinas, Ribeirão Preto estão com leitos públicos e privados sobrando”, diz.
Segundo ele, o setor de medicina diagnóstica também está em apuros. “Se não tem atendimento médico,
não tem exames”, afirma ele.
Até o fim de abril, a Abramed (Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica) contabilizava queda de 70% nos exames de imagem, por exemplo. Nos laboratórios clínicos, o atendimento tinha caído, em média, 60% se comparado ao movimento registrado no mesmo período de 2019.
Assim como os hospitais privados, a Abramed também busca alternativas como uma linha de crédito do BNDES para poder manter o quadro de funcionários e arcar com seus custos fixos.
O setor tem feito campanhas voltadas à população no sentido de que ela não deve interromper tratamentos e nem a busca por diagnóstico, caso estejam sentindo sintomas de doenças, por medo de contágio do coronavírus.
A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) também alertou sobre o risco da interrupção de tratamentos e disse que jamais recomendou a suspensão ou proibiu a realização de internações e cirurgias eletivas.
Fonte: Folha de SP