Um dos sintomas do que chamo de Senzala com complexo de Casa Grande é ouvir assalariado dizendo que sindicato não serve para nada. Provavelmente não é o que acham 15 trabalhadores de uma rede de lojas de departamentos de Gravataí, que ganharam ação coletiva de R$ 250 mil movida pelo Sindicato dos Empregados no Comércio.
Os valores, que variam conforme o tempo trabalhado, e vão de R$ 1,8 mil até R$ 33 mil, são compensações pelos vendedores comissionados terem sido submetidos a desvio de função ao ser deslocados dos pontos de venda para carregar e descarregar caminhões, por vezes em horários fora do expediente.
O comerciário que recebeu o maior valor foi pego de surpresa. Nem lembrava a ação que tramitou por quatro anos até o ganho de causa no Tribunal Superior do Trabalho, com o escritório Kahle e Bitencourt Advogados representando o Sindec.
– Enquanto estava descarregando produtos, os funcionários não podiam vender e receber comissões, que representavam a maior parte dos salários – resume o advogado Bruno Kahle, que elaborou a ação após o sindicato receber a denúncia.
Nenhum dos trabalhadores contribuía para o sindicato após a obrigatoriedade cair com a reforma trabalhista de 2017.
– O sindicato trabalha por todos, mesmo para os que não contribuem. Infelizmente, o movimento sindical vive o pior momento. E foi o movimento sindical a conseguir 44 horas de jornada de trabalho, repouso remunerado, férias, 13º salários... É o trabalhador o maior prejudicado com sindicatos fracos – alerta Antenor Mariano Federizzi, diretor-financeiro dos comerciários, que na manhã desta quinta acompanhou a assinatura do parcelamento em seis vezes ao lado dos beneficiados com a ação.
– Fui pega de surpresa! Vou me associar. Quando acontece com a gente percebemos a força do sindicato. É um dinheirinho que vem em uma boa hora – comemora Tatiane Imperatore da Silveira, que saiu da loja condenada há um ano.
Com 30 anos de sindicalismo, Federizzi calcula que as contribuições caíram 90%, em uma base que não chega a dois mil, dos 20 mil comerciários que trabalham em Gravataí, Cachoeirinha, Canoas e Nova Santa Rita, área de cobertura do Sindec.
– Hoje estou entregando a chave da sede em Gravataí, estamos sublocando a colônia campestre de Capão da Canoas, reduzindo fiscais das denúncias, diminuindo atendimentos médicos e também matrículas na nossa escola de educação infantil – lamenta o comerciário de 65 anos que começou a trabalhar como empacotador de supermercado, até chegar à gerência.
A previsão de Federizzi não é nada boa:
– Continuando como está em cinco anos o sindicato fecha.
É o período em que o experiente sindicalista calcula os assalariados sentirão de forma mais dramática os efeitos da reforma trabalhista, principalmente nas negociações com os patrões sem a força de um sindicato.
– O trabalhador ainda vai apanhar muito até sentir que o sindicato é necessário – constata Federizzi.
A Nota Técnica 177 A importância da organização sindical dos trabalhadores, publicada pelo DIEESE, analisou o conteúdo de mais de 56 mil convenções coletivas e 308 mil acordos coletivos de trabalho celebrados entre 2007 e 2017 e mostrou que 93% dos instrumentos tratam de questões salariais, como gratificações, adicionais, auxílios; 89% abordam o contrato coletivo de trabalho (admissão e demissão); 87% referem-se às condições de trabalho, normas de pessoal e estabilidade; 89% regulam a jornada de trabalho (duração, distribuição, controle e faltas); 70% tratam das férias e licenças; 85% regulam questões de saúde e segurança; 92% regulam as relações sindicais, além de definirem regras paras as negociações e solução de conflito.
Enfim, complexos e guerra ideológicas à parte, negociações mais importantes para a Senzala do que para a Casa Grande.
CONHEÇA O SINDICATO
Acesse o site do Sindec clicando aqui. Ali estão informações inclusive sobre as convenções e negociações de dissídios de uma série de categorias.
Fonte: http://seguinte.inf.br