A necessidade de complementar a renda da aposentadoria, tema até então mais debatido por quem ganha acima dos R$ 5.839 do teto do INSS, se estenderá também a trabalhadores com salários mais baixos. Isso porque a proposta de reforma da Previdência do governo Jair Bolsonaro deverá reduzir o valor dos benefícios de todos os trabalhadores que ganhem mais que o salário mínimo.
São duas as vias de corte nas futuras aposentadorias: para receber o valor integral do benefício, além de atingir a idade mínima, o trabalhador precisará comprovar 40 anos de contribuição ao INSS.
Além disso, os salários mais baixos serão incluídos na conta para o cálculo da aposentadoria, o que também reduz o valor dos benefícios na comparação com as regras atuais.
De acordo com o texto, homens de 65 anos e mulheres de 62 poderão se aposentar desde que comprovem 20 anos de contribuição para a Previdência. Nesse caso, porém, o benefício será limitado a 60% do valor a que teriam direito caso contribuíssem por 40 anos. Cada ano adicional de contribuição eleva em 2% a renda futura.
“A gradação praticamente acaba com a aposentadoria integral. O trabalhador teria que começar cedo e com salário já elevado. Quem quer que queira ter aposentadoria maior tem que estar preparado para trabalhar até mais tarde e complementar renda”, diz Jorge Boucinhas, professor da FGV.
Atualmente os benefícios de trabalhadores que não alcançam o fator 86/96 (que soma idade e tempo de contribuição) são reduzidos pelo fator previdenciário. Na prática, o sistema tende a punir com mais força aqueles que pedem a aposentadoria antes dos 60 anos.
Além disso, o valor do benefício faz uma média dos salários de contribuição excluindo os 20% mais baixos.
Pela regra proposta na reforma, todos os salários serão considerados, o que também pode reduzir o benefício, já que, tipicamente, trabalhadores começam a carreira com ganhos menores, que vão aumentando ao longo da carreira.
“Cria um desconforto, as pessoas vão ter que pensar em como elas contribuem ao longo da vida. A reforma é mais dura, mas garante um pagamento de benefício”, acrescenta Juliana Inhasz, professora de economia do Insper.
Segundo ela, a situação dos trabalhadores com cerca de 40 anos é a mais complicada. É uma população que jogava “com o regulamento embaixo do braço”: esperava trabalhar mais uns dez anos e, no caso dos autônomos, poderia elevar o salário de contribuição a partir de agora, para garantir uma aposentadoria maior mais para a frente.
“Agora não vai ter essa possibilidade, e essas pessoas vão ter que se acostumar a um sistema diferente daquele para o qual contribuíram. Relativamente, elas perdem muito”, afirma a professora do Insper.
Aos 40, quem ainda não poupa para a velhice deveria separar entre 13% e 14% da renda, afirma a professora.
Para ela, aplicações deveriam ser sempre em títulos de renda fixa atrelados à inflação, que garantem o poder de compra ao longos dos anos.
O exemplo mais repetido pelos especialistas é o título público Tesouro IPCA+.
Renato Follador, especialista em Previdência e estruturador de fundos de pensão no Paraná, afirma que entre 5% e 6% da renda costuma ser suficiente para manter o padrão de vida na aposentadoria no caso dos trabalhadores com salário até R$ 10.000. Acima desse valor, a necessidade de poupança é maior, assim como no caso de quem tem pouco tempo para poupar.
Aos 30 anos, o trabalhador ainda terá outros 30 para poupar para a aposentadoria. Nesse caso, Inhasz, do Insper, sugere que o trabalhador poupe cerca de 10% da renda mensal.
Isso permitiria que, a cada ano, ele tivesse entre um salário e um salário e meio guardados para a velhice.
Para quem está na faixa dos 20 anos, a situação é mais confortável, porque há tempo para poupar e os juros jogam mais a favor, pelo longo período de investimento.
É por isso que especialistas recomendam que a poupança comece desde cedo.
“Normalmente, do valor total da poupança previdenciária, 69% são dos juros do investimento. Em 35 anos [o tempo atual de contribuição exigido para homens] é muito dinheiro”, afirma Follador.
Ele é entusiasta do benefício tributário, com abatimentos de Imposto de Renda dos fundos de previdência.
O tema não é consenso entre especialistas. O pequeno investidor ainda tem dificuldade de encontrar fundos de previdência que tenham taxas baixas e não comam o rendimento da aplicação, especialmente no caso de produtos mais conservadores.
Na média, os fundos de previdência complementar atrelados à renda fixa renderam 6,54% nos últimos 12 meses, em linha com a Selic, em 6,5%.
“Além da decisão de poupar, as pessoas precisam decidir também que tipo de aplicação desejam fazer”, afirma Inhasz.
COMO POUPAR PARA A APOSENTADORIA
O que é o salário de contribuição?
É o valor considerado para o recolhimento mensal do INSS e usado de referência para o cálculo da contribuição ao INSS.
Quem ganha salário acima do teto, atualmente de R$ 5.839, recolhe um valor limitado ao teto
É possível se aposentar recebendo o teto do INSS?
Atualmente isso já é difícil, porque 80% das contribuições deveriam ser feitas pelo teto do INSS. Com as novas regras propostas pelo governo, todas as contribuições deveriam ser pelo teto, e o trabalhador deverá comprovar 40 anos de contribuição ao INSS. Na prática, as aposentadorias serão menores no futuro
E como fazer para garantir que terei renda para me sustentar na velhice?
É preciso economizar parte da renda atual exclusivamente para a aposentadoria, dizem especialistas
Para quem começa a poupar
Aos 20 anos
Entre 5% e 6% do salário líquido mensal
Aos 30 anos
Cerca de 10% do salário deve ser suficiente para quem deseja complementar a renda
Aos 40 anos
Cresce o percentual da renda que deve ser economizado, para até 14% do salário. No entanto, a necessidade é maior para quem tem salários superiores a R$ 10.000 e deseja manter o padrão de vida
Onde investir?
Depende da idade e do apetite a risco do investidor. Mais jovens e arrojados podem ter parte do dinheiro em ações
A principal recomendação é para renda fixa que segue a inflação, como Tesouro IPCA+. Como rende uma taxa de juros acima da inflação, garante o poder de compra do dinheiro no futuro
Fonte: Folha de SP