Por Edison Laércio de Oliveira
Somente no Estado de São Paulo existem mais de 700 mil trabalhadores atuando na área da saúde. E isso nos setores privado e filantrópico. Se somados os que atuam no setor público este número ultrapassa a um milhão. Nossa entidade já realizou pesquisas que apontam que deste contingente, 70% são mulheres. Ou seja, temos por volta de 500 mil mulheres somente no setor privado, ou perto de 700 mil se englobados todos os setores, que dedicam seus dias a cuidar da saúde da população. É um verdadeiro batalhão que se reveza nos hospitais, clínicas, laboratórios, consultórios e demais estabelecimentos de saúde existentes para garantir a saúde e a produtividade do Estado de São Paulo. São Técnicas e Auxiliares em enfermagem, enfermeiras, parteiras, cozinheiras, copeiras, profissionais da higiene, dentre outras funções necessárias a realização de um trabalho de qualidade para os pacientes.
Em geral, este trabalho é realizado dia e noite, ininterruptamente. Estas trabalhadoras tem dupla e até tripla jornada de trabalho. Nos estabelecimentos de saúde atuam com jornadas que podem ser de 6 horas diárias, 12 X 36 ou 8 horas diárias. Muitas possuem duplo emprego. E se revezam diuturnamente dentro de um sistema de saúde precário e com pouco ou nenhum investimento que garanta a elas condições dignas de trabalho ou mesmo um tratamento mais humanizado diante dos traumas e estresses que fazem parte da rotina, mas cujo sofrimento testemunhado diariamente jamais deixa de causar impacto emocional nestas profissionais que estão ali para contribuir para a manutenção da saúde de todos.
E são estas mulheres, profissionais dedicadas, que saem muitas vezes de um trabalho para o outro ou do trabalho para a escola na busca de aperfeiçoamento para depois retornar às suas casas para cuidar dos afazeres domésticos, dos seus maridos, pais, irmãos ou filhos. Houve tempo em que as jornadas eram estafantes, desumanas mesmo. Trabalhava-se por até 15 horas por dia e as consequências eram nefastas: acidentes de trabalho, afastamentos prolongados e aposentadorias precoces também entraram para a rotina do sistema de saúde. E o prejuízo desse quadro para a qualidade em saúde e, claro, também para os cofres públicos é incalculável.
O movimento sindical teve importante papel na queda dos índices de acidente de trabalho e das doenças profissionais, na melhoria das condições de trabalho e na valorização dos profissionais que atuam na área da saúde, destaque-se, destas mulheres guerreiras que se desdobram em seu dia a dia.
Para que isso fosse possível, foi preciso primeiro que esta categoria entendesse que são elos de uma corrente que se fortalece na medida em que cresce. Foi preciso que os diretores, mantenedores, provedores, superintendentes dos estabelecimentos de saúde tivessem um olhar diferenciado e com maior sensibilidade para suas trabalhadoras e trabalhadores. E foi a ação de sindicalistas sérios e cientes de seu dever que permitiu a mudança desta realidade. Essas trabalhadoras ganharam folgas extras nas sua rotina de trabalho: 4 ou 5 na jornada de 6 horas diárias, duas ou três na jornada de 12 X 36 e sábados e domingos livres quando se trabalhava 8 horas diárias.
Os salários cresceram, ganharam o status de salário profissional de ingresso e os benefícios se multiplicaram com anuênio, cesta básica mensal, adicional por hora extra e adicional noturno compatível com o trabalho e função, além do justo adicional de insalubridade.
E assim as mulheres da saúde cresceram e passaram a ser vistas com mais respeito pela sociedade. A escala evolutiva não pode parar ainda que em alguns momentos ela fique estacionária. É apenas o tempo para que as forças sejam realinhadas e a batalha possa ser reiniciada.
Hoje talvez estejamos neste estágio, no momento de acumular forças para reagir aos desmandos e a investidas contra os direitos e conquistas acumuladas ao longo das últimas três décadas. Com a aprovação da reforma trabalhista, os benefícios e direitos conquistados ao longo de anos estão em risco real de se perderem. E estas mulheres guerreiras, profissionais de primeira linha na luta pela vida da população, poderão retornar à condição no qual sua capacidade produtiva e sua própria saúde eram explorados.
Isto é um fato real. Já existem hospitais e outros estabelecimentos de saúde propondo o fim das folgas e também o fim de outros direitos básicos desta categoria. E não existe segredo. Para resistir e manter os benefícios que retornam em melhor atendimento para a população, é preciso que as mulheres guerreiras da saúde se unam, se perfilem formando uma corrente, um paredão que ninguém pode romper. Aí sim, além de manter os avanços que já foram realizados, outros poderão se somar. Só é preciso ter claro que o fio condutor desta corrente do bem, são os sindicatos representantes das trabalhadoras e dos trabalhadores que atuam no setor da saúde em prol de um Estado e de uma população que já soma mais de 45 milhões de pessoas. Respeito é bom e as milhares de trabalhadoras da saúde gostam. E vão batalhar para mant-lo.
Edison Laércio de Oliveira é presidente da Federação dos Trabalhadores da Saúde do Estado de São Paulo, diretor nacional da Saúde da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e vice-presidente da Uni Américas/Uni Global Union.