Preocupado porque o dinheiro da aposentadoria vai secar e você não tem reservas para garantir seu nível de vida até os 80, 90 ou 100 anos?
Você não está sozinho. Em cada 100 brasileiros, só 4 separam recursos para os anos finais, o índice mais baixo das Américas e um dos piores do mundo. Em levantamento de 143 países feito pelo Banco Mundial, só 11 estão abaixo.
A imprevidência atinge até os brasileiros de renda mais alta, e não é uma questão de pobreza: o Brasil perde de nações como Congo, Maláui ou Togo, que têm PIB per capita próximo de US$ 1.000 em paridade de poder de compra, medida que permite melhor comparação entre os países.
No Brasil, o PIB per capita foi US$ 15,4 mil em 2015, semelhante ao da Tailândia, em que 60% poupam para a velhice. Os dados, de 2014, foram retrabalhados em 2016 visando especificamente a reserva para a idade avançada.
O estudo do Banco Mundial encontrou forte correlação entre a economia para a velhice e o hábito geral de poupança. Em países asiáticos, onde a maioria das pessoas faz reservas financeiras de forma regular, a porcentagem dos que poupam para os anos finais também é mais alta.
Na Tailândia, 80% da população declara ter poupado algum dinheiro nos 12 meses anteriores. No Brasil, são 28% (o 14º pior índice no mundo).
Executivos do setor atribuem isso à herança do período de inflação descontrolada que durou até os anos 1990. "Há 20 anos, mal era possível planejar para o fim do mês", diz Paulo Valle, vice-presidente da Fenaprevi, federação do setor de previdência privada.
"Não existiam no mercado produtos para a aposentadoria", afirma Flavio Kokis, diretor da Guide Life, uma empresa de planejamento financeiro. Segundo Kokis, 90% das famílias que o procuram não têm reserva financeira.
"Não consigo pensar no depois. Se quero uma coisa, compro. Nunca consegui poupar", diz a analista de eventos Fádua Silva, 28, que tem renda própria desde os 18.
Casos como o de Fádua são comuns entre os que não poupam, segundo pesquisadores da área. Experimentos conduzidos por psicólogos desde os anos 1960 mostram que crianças conseguem conter a vontade de comer marshmallow quando são informadas de que ganharão mais doce se esperarem. Ou seja, para ter dinheiro no futuro, é preciso abrir mão de gastá-lo já.
Conhecer as causas não basta, porém. A educação financeira, por exemplo, tem alta correlação com poupança. Mas estudos indicam que mesmo os mais ricos e escolarizados ignoram conceitos como diversificação, juros compostos, custo-benefício e a relação entre risco e lucro.
O investimento em educação financeira, portanto, é alto e obtém pouco resultado duradouro, segundo as pesquisas. São as ações diretas sobre o comportamento que alcançam êxito maior e mais rápido, diz Leora Klapper, economista-chefe do time de pesquisa em finanças e setor privado do Banco Mundial.
Ter sua própria conta bancária é um fator importante, principalmente se houver facilidade para transferir recursos e fazer investimentos.
Klapper relata experiências em Gana e em Bangladesh, em que cidadãos recebem no dia do pagamento um lembrete para poupar. Em Gana, 55% têm o hábito de poupar e 13% economizam para a velhice. No país asiático, são 24% e 6%, respectivamente.
Políticas públicas também são fundamentais para a transição da seguridade social para um modelo de planos privados, argumenta uma das principais especialistas em previdência e educação financeira do mundo, a professora Olivia Mitchell, de Wharton, a escola de negócios da Universidade da Pensilvânia.
"Isenções fiscais, por exemplo, podem incentivar investimentos em alguns tipos de previdência, mas ainda assim boa parte da população só poupará se houver adesão automática", diz ela.